Editorial
JP, 20 de junho
De
novo é a juventude que dá início ao que parece ser mais um prolongado processo
de mudança no Brasil. Seja, embora, o dinheiro da corrupção e da manipulação
incalculável, apenas 20 centavos de um reajuste na tarifa de transportes
serviram de estopim para detonar a bomba de efeito retardado que se consumia em
fogo lento na mentalidade esparsa da opinião pública brasileira.
Os
governantes estavam talvez esquecidos do quanto é brutal pagar três reais por
uma tarifa de transportes num país em que o salário mínimo não chega a R$ 600.
Destinaram R$ 30 bilhões para a construção superfaturada de arenas de futebol,
seguindo o eterno ensinamento do pão e circo – no caso muito mais circo do que
pão – de Maquiavel, sem ouvir o que estavam “sussurrando pelas alcovas”,
“cantando em versos e trovas” a cada vez que, inutilmente, um cidadão precisava
de hospital; a cada vez que um plano de saúde mandava alguém de volta da porta
do consultório.
A
propaganda de um paraíso em desenvolvimento, conscientemente paramentada pelos
efeitos dos programas sociais, confronta-se com a violência diária e
ininterrupta dos assaltos que só a miséria consegue proporcionar. A educação
privatizada e a saúde privatizada, imediatamente substituíram as tarifas de
transportes nas faixas e cartazes que o povo levou para as ruas. E foram os
meninos rebelados das redes sociais que deram início a esse monumental protesto
que se espalhou pelo país. Do inconsciente dos que mal sabiam o que estavam fazendo,
brotou a consciência coletiva que veio dizer um basta à manipulação das massas
e à corrupção.
Os
mesmos meninos de sempre. Eles, que em outros tempos foram às praças pedir o
fim da ditadura militar, que exigiram eleições diretas pintando os rostos de
verde e amarelo, estão de volta. Agora para dizer que o dinheiro da corrupção
basta para que tenhamos transporte público de qualidade; basta para por fim à
visão grotesca de pacientes gritando nos
corredores dos hospitais; basta para vencer o analfabetismo e a pobreza
absoluta.
A
liberdade os construiu. Com o fim da censura, as notícias de que estão roubando
até a merenda escolar das crianças chegam às suas casas pela TV e amanhecem em
seus computadores. Eles vêem, ouvem e são tomados da mesma indignação que em
outros tempos serviu para mudar o país. São apartidários sim, mas não são
apolíticos. Ninguém o é.
Sabem que ladrão de dinheiro público quase
nunca vai preso ou fica muito pouco tempo na prisão no Brasil. E estes abusaram
do poder. Transformaram o país na República dos conchavos e das negociatas. E o
misto de paz e revolta com que hoje ornamentam a democracia brasileira é um
prêmio ao estado de direito corroído por tiranos e corruptos e uma esperança
renovadora para o futuro desta Nação.
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